11.3.13

Roteiros - Aeroplanos

Fala, maníacos pela escrita. Beleza? Hoje estou adicionando uma coluna nova que fala sobre uma das artes de escrever que são os roteiros. Sucintos, criativos e focados em passar instruções para um diretor e para quem fará a fotografia. Seja cinema, séries, curtas, tudo começa em um roteiro. E tudo pode terminar nele se não for dos bons. Eu tenho a opinião que um roteiro para ser bom tem que te tocar ainda no papel impresso. Daí é certeza que no ecrã vai agradar também. 

Todo mundo dessa área sempre indica, no quesito nacional, o filme Cidade de Deus, eu como não gosto do gênero decidi que não iria aprender as técnicas em cima de algo que não me daria prazer só porque é bem feito. Então lembrei de um antigo curta gaúcho que para mim é memorável entre outros tantos, esse me marcou. É a história de um casal que vive praticamente sua vida conjunta em um aeroporto, só que ela detesta-os de morte. E essa crise vai mostrar do que o amor deles é feito. E sabe o que é mais legal? Fui relê-lo no ônibus voltando pra casa e me emocionou novamente, dessa vez em texto. Confesso que um aperto no coração daqueles que antecedem um choro brotou de leve. Pena não achar o vídeo dele, os atores foram ótimos e daria para mostrar a transformação. Enfim, curtam aí! Entenderam? Huhu...

Alex Sernambi

 

AEROPLANOS

Roteiro em modo texto: [ Download ]
               AEROPLANOS
               episódio da série
               CONTOS DE INVERNO 2002
               argumento e roteiro de
               Marcelo Pires
               Versão 28/03/2002
               coordenação de texto da série
               Jorge Furtado
               e Giba Assis Brasil
               produção: Casa de Cinema de Porto Alegre
               para RBS TV
*******************************************************************
CENA 1 - SAGUÃO DO AEROPORTO / NOITE
Tião espera no saguão do aeroporto. Olha o relógio.
               VOZ DO AEROPORTO
               Informamos a chegada do vôo 2341 procedente do Rio
               de Janeiro, com escala em Curitiba.
CENA 2 - ARQUIVO / NOITE
Avião aterriza.
CENA 3 - SAGUÃO DO AEROPORTO / NOITE
Tião arruma o cabelo com a mão.
CENA 4 - SALA DAS BAGAGENS / NOITE
Alice entra na sala das bagagens.
CENA 5 - SAGUÃO DO AEROPORTO / NOITE
Tião bota a camisa pra dentro das calças.
CENA 6 - SALA DAS BAGAGENS / NOITE
Alice espera no lado da esteira de bagagens.
CENA 7 - SAGUÃO DO AEROPORTO / NOITE
Tião coloca um Halls na boca.
CENA 8 - SALA DAS BAGAGENS / NOITE
Esteira de bagagens pára. Alice está sozinha na sala.
               ALICE
               Cadê a minha mala?
CENA 9 - SAGUÃO DO AEROPORTO
Tião espera no saguão do aeroporto. Olha o relógio.
CENA 10 - SALA DAS BAGAGENS
Alice no balcão, fala com a moça da companhia.
               MOÇA
               A senhora poderia descrever a sua mala?
               ALICE
               É triste.
               MOÇA
               A sua mala é triste?
               ALICE
               Esta situação é triste.
               MOÇA
               Eu sei, mas a senhora poderia descrever a sua
               mala?
               ALICE
               É horrível.
               MOÇA
               Isso acontece, tenho certeza que nós...
               ALICE
               A minha mala é horrível. Pesadona. Difícil de
               carregar. Um suplício. Detesto malas. Detesto
               aeroportos. A senhora é do pessoal de terra, né?
               Pois é: eu também. Eu sou do pessoal de terra. E
               quero a minha mala! A minha mala horrível. Mas, eu
               quero.
CENA 11 - SAGUÃO DO AEROPORTO / NOITE
Alice, com papelzinho na mão, sai pela porta da sala de
desembarque. Carrega o papelzinho como se ele fosse precioso, o
único papelzinho do mundo.
Tião está dormindo na cadeira. Alice chega ao lado dele, vê ele
ressonar.
               ALICE
               (grita) Curitiba!
Tião toma um susto. Levanta-se.
               ALICE
               A minha mala horrível está em Curitiba. Chega em
               mais ou menos duas horas. Temos que esperar.
               TIÃO
               Boa noite (pausa)... meu amor.
               ALICE
               Boa noite pra quem?
               TIÃO
               Vamos tomar um café (pausa)... meu bem?
CENA 12 - SAGUÃO / NOITE
Tião e Alice caminham pelo saguão.
               ALICE
               Café preto e pão de queijo, café preto...
Tião e Alice param na frente do elevador. Tião chama o elevador,
aperta o botão.
               ALICE
               ... e pão de queijo, a dieta típica de quem vive
               em aeroporto.
O elevador chega. Tião segura a porta e dá passagem pra Alice.
               TIÃO
               Você primeiro (pausa), minha querida.
CENA 13 - ELEVADOR
Interior do elevador. O elevador pára, estraga entre dois
andares.
               ALICE
               O que é isso?
               TIÃO
               Parou.
               ALICE
               Isso eu sei. Parou por quê?
               TIÃO
               Isso eu não sei. Calma.
               ALICE
               Eu não acredito.
               TIÃO
               Já vai andar, calma.
               ALICE
               Eu não acredito. Presa em um relacionamento que
               está preso em um elevador que está preso em um
               aeroporto. Eu não vou suportar ficar aquiþ sem
               decolarþ nem aterrissarþ sem decolar... nem
               aterrissar... elevador é uma espécie de nave....
               sim: é uma aeronave... elevador é um tipo de
               avião... só que mais apertado... mais abafado...
               mais enlouquecedor... mais...
               TIÃO
               Quem me dera estar dentro de um avião. A gente
               teria poltronas. E serviço de bordo.
               ALICE
               Você é engenheiro, Tião, faça alguma coisa.
Pausa.
               TIÃO
               (grita) Socorro! Alguém aí do aeroporto...
               socorro... nós estamos presos no elevador...
               socorro!
               ALICE
               A faculdade de engenharia ensina a berrar? Você
               tem graduação em grito?
               TIÃO
               Alice, fique quieta. Deste jeito ninguém vai ouvir
               os meus gritos. Calma, eles já estão
               providenciando tudo.
               ALICE
               Eles quem, Tião?
             
               TIÃO
               Sei lá. A guarda costeira. A cruz vermelha. A ONU.
               O Greenpeace. Os super-amigos. Enfim, o pessoal do
               aeroporto. Não vai levar nem um minuto, você vai
               ver.
             
               ALICE
               (olha o relógio) Quando passar o minuto, eu aviso.
             
               TIÃO
               Alice, fique quieta, ok?
             
               ALICE
               Ok.
Alice dá as costa pra ele. Tião dá as costas pra ela.
CENA 14 - ELEVADOR / NOITE
Eles em outra posição, se evitando dentro do elevador.
passagem de tempo.
Eles em outra posição, se evitando dentro do elevador.
passagem de tempo.
Eles em outra posição, se evitando dentro do elevador.
passagem de tempo. Alice repara em um pacote que Tião trouxe
consigo.
               ALICE
               O que é isso?
               TIÃO
               Um presente.
               ALICE
               Já que não tem mais ninguém por aqui, presumo que
               seja para mim.
Ele dá o presente, ela abre, é um vestido. Vermelho. Ela gosta.
Vai tirando a roupa.
               ALICE
               Vou experimentar. Isso aqui parece um provador
               mesmo.
Ela fica de calcinha e sutiã.
               ALICE
               Olhe pro outro lado.
Tião se vira, mal humorado.
               TIÃO
               Não é a primeira vez que você se troca na minha
               frente.
             
               ALICE
               Talvez seja a última. Vire-se. Mesmo dentro de um
               elevador, tenho direito à um mínimo de liberdade.
Fica linda no vestido. Tião se vira. Olha pra ela.
               TIÃO
               Você ficou linda. A mulher mais linda deste
               elevador.
               ALICE
               É pouco.
               TIÃO
               A mulher mais linda deste aeroporto.
Eles se beijam. Pinta o maior climão.
               ALICE
               Ainda é pouco.
               TIÃO
               A mulher mais linda da cidade.
               ALICE
               Melhorou. Mas... ainda... sei lá... poderia ser
               melhor.
Eles se agarram pra valer.
               TIÃO
               A mulher mais linda do Brasil. Não: do mundo.
               ALICE
               Parabéns. Agora ficou razoável.
Neste agarro, toca música (do Jorge Mautner): Aeroplanos
               você faz tantos planos
               fica voando em aeroplanos
               da imaginação
               porque não faz seu campo de pouso
               no aeroporto do meu coração
               você voa com as nuvens
               que são penugens
               cor de algodão
               e só retorna pra terra com a chuva
               como gotas negras que batem no chão
Alice e Tião transam. A câmera deriva e mostra o sinal de "pra
cima" e o sinal de "pra baixo", mostra o sinal de "pra cima" e o
sinal de "pra baixo", mostra o sinal de "pra cima" e o sinal de
"pra baixo" mostra o sinal de "pra cima" e o sinal de "pra
baixo".
CENA 15 - ELEVADOR / NOITE
Alice e Tião, sentados no chão do elevador, a cabeça dela no
ombro dele.
               ALICE
               Sabe o que eu mais detesto em aeroporto? Aeroporto
               parece uma enorme sala de reunião. Um monte de
               homens, homens de terno e gravata tomando
               cafezinho, um monte de pastas, um monte de
               agendas, um monte de celulares. E poucas mulheres.
               TIÃO
               Tem mais homem, mas tem mulher também.
               ALICE
               São minoria, sempre. E quase todas estão de
               taillers. Taillers e escarpans. Taillers com
               enchimento nos ombros. E escarpans de salto alto.
               Aeroporto tem mármore por todos os cantos, e
               cadeiras de plástico, e detalhes em aço. Por quê
               não existe um aeroporto rústico? Só vou gostar de
               um aeroporto quando tiver taboão no chão. E móveis
               de vime. Com grandes almofadões. E lareira!
Alice levanta, espia para fora do elevador.
               ALICE
               Não suporto mais esta vidaþ eu sou jornalista, não
               sou comissária de bordo... quando é que a gente
               vai morar junto?
               TIÃO
               Não sei, estou no 14§ piso de uma obra de 20
               andares.
               ALICE
               Não, Tião, você está preso entre o térreo o e 1§
               andar do aeroporto, em um elevador, só comigo.
               Seja sincero: algum dia nós vamos morar juntos?
               TIÃO
               Não quero ir pro Rio.
               ALICE
               Eu venho pra cá.
               TIÃO
               Não sei, Alice. Travei. Como o elevador.
Ela se afasta, vai para o outro lado do elevador. Com raiva,
Alice bate o pé na parede e, neste momento, o elevador se
movimenta.
CENA 16 - SAGUÃO / NOITE
As portas abrem. Um pequeno grupo vê o casal sair do elevador. No
grupo está JOANA (o travesti da história do "Dr.Genarinho")). O
grupo assusta Alice. Acuada, ela sai gritando, passando entre os
curiosos.
               ALICE
               Perdi um ano e meio da minha vida!
               JOANA
               Mulher é assim: fica quinze minutinhos presa, já
               diz que é uma vida inteira. Exageraada...
CENA 17 - BANHEIRO FEMININO/ NOITE
Alice entra no banheiro feminino. Surge a senhora da limpeza.
Alice tira o vestido vermelho e recoloca a roupa com a qual
chegou.
               SENHORA
               Já sei, briga com o namorado.
               ALICE
               Ex! Ex-namorado.
               SENHORA
               Isso mesmo... como é mesmo o seu nome?
               ALICE
               Alice.
               SENHORA
               Isso mesmo, Alice. Homem é que nem avião. Se a
               gente perde um, logo pega outro.
Tião tenta entrar no banheiro. A senhora da limpeza não deixa.
Empurra ele com a vassoura.
               TIÃO
               Alice, eu quero falar com você.
               SENHORA
               Homem não entra aqui.
               TIÃO
               Alice, manda esta mulher sair da minha frente...
               SENHORA
               Quem manda neste banheiro sou eu. Desinfeta.
               ALICE
               Exato, Tião. Desinfeta.
CENA 18 - SAGUÃO / NOITE
Tião do lado de fora do banheiro. Joana chega.
               JOANA
               Não deixaram você entrar no banheiro feminino?
               TIÃO
               Não.
               JOANA
               Não liga, fazem isso comigo o tempo todo.
CENA 19 - BANHEIRO FEMININO
               ALICE
               Tião é daqui, eu sou do Rio. Não agüento mais
               aeroporto.
               SENHORA
               Eu trabalho há 10 anos neste serviço. Também não
               agüento mais aeroporto.
               ALICE
               Ele não quer viver comigo. Não quer ter (faz um
               gesto mostrando o ambiente em volta) um banheiro
               em comum comigo, entende?
               SENHORA
               Viver junto, tudo bem, Alice, mas, acredite em
               mim, é melhor cada um ter o seu banheiro. Homem
               nunca levanta a tampa do vaso. Deixa toalha
               molhada em qualquer lugar.
               ALICE
               Aperta a pasta de dente sem método nenhum.
               SENHORA
               Molha toda a pia quando faz a barba. E ainda
               reclama quando a gente deixa a calcinha secando no
               registro. Vai pendurar a calcinha aonde? No lustre
               da sala?
               ALICE
               A senhora me convenceu.
As duas riem. A senhora dá um beijo maternal na testa dela.
CENA 20 - BANHEIRO MASCULINO
Joana no mictório. Tião na pia.
               JOANA
               Você vai esperar por ela?
               TIÃO
               Vou.
               JOANA
               Tem certeza?
               TIÃO
               Tenho.
               JOANA
               Não quer, por exemplo, pegar um elevador comigo?
               TIÃO
               Não.
               JOANA
               Eu conheço um elevador ótimo ... espaçoso... com
               piscina... cama redonda... churrasqueira...
               TIÃO
               Eu preferia ficar sozinho. Se você não se importa.
               JOANA
               Se você quer ficar sozinho, vai conseguir. Quando
               ela sair deste banheiro, não vai nem olhar na sua
               cara. Tchau!
Tião olha-se no espelho.
               TIÃO
               (para a câmera) Pior que ele tem razão.
CENA 21 - BANHEIRO FEMININO
Alice, no espelho, se recompõe.
               ALICE
               Brigada, viu? Eu não sei o que seria de mim se eu
               não tivesse encontrado a senhora. Eu seria capaz
               de usar todas estas folhas de papel... de tanto
               chorar... e aqui, olha só, recomendam que a gente
               só use duas folhas...
               SENHORA
               Quem escreveu isso nunca chorou num banheiro de
               aeroporto.
               ALICE
               Nunca... gente contida... gente mesquinha... só se
               permite duas folhinhas de choro... eu não... eu
               juro... juro que nunca mais ponho meu pé aqui... a
               senhora e Salgado Filho que me perdoem... vou
               agora pro Rio... (dá um cartão pra senhora)...este
               é o meu telefone...me liga, por favor...
               SENHORA
               Ligo, minha filha, mas a cobrar. Esse tal de
               Salgado Filho me paga uma miséria!
               ALICE
               Tá combinado. Deu pra ti, baixo astral... Porto
               Alegre, tchau.
               SENHORA
               Tchau, Alice.
Alice já trocou de roupa. Sai do banheiro, esquecendo o vestido
vermelho lá, em cima da pia. A senhora percebe o vestido, sai
atrás dela.
CENA 22 - SAGUÃO / AMANHECER
Surge a senhora, atrás de Alice. Mas, estanca. Percebe Tião
tentando acalmar Alice. Alice está comprando uma passagem no
balcão da companhia.
               TIÃO
               Alice, vamos conversar. Fica comigo.
             
               ALICE
               (cantarola) ...aperte o cinto, vamos chegar
               dentro de mais um minuto estaremos no Galeão...
               pa-ra-pa-ram!
             
               TIÃO
               Alice, deixa de bobagem, fica até manhã.
Alice pega a passagem e mostra pra Tião.
               ALICE
               Tião, eu nunca tive tanto prazer em voar. Na
               verdade, eu nunca tive prazer em voar. Será a
               primeira vez. Adeus, Tião.
             
               TIÃO
               E a sua mala?
             
               ALICE
               Fica com ela, Tião. Vocês foram feitos um para o
               outro.
Embarca imediatamente. Tião fica sem reação, fica olhando Alice
ir embora. A senhora, ainda com o vestido na mão, se aproxima e
diz pra Tião.
               SENHORA
               Entendeu?
             
               TIÃO
               O quê?
             
               SENHORA
               O comentário sobre a mala.
             
               TIÃO
               Entendi. Ela insinuou que eu sou um tremendo mala
               e combino com a aquela mala horrível...
             
               SENHORA
               Não, ela quis dizer que você... e a horrível
               mala... estão perdidos.
Alice passa pela porta de embarque. Não olha pra trás. A moça
confere as passagens, na porta do Embarque.
A senhora vai embora. A moça lá do começo, a moça da sala de
embarque, aparece e traz a mala, horrível realmente, e deixa do
lado de Tião.
               MOÇA
               Ela já foi?
             
               TIÃO
               Já.
Entrega um papel e uma caneta a ele.
               MOÇA
               Eu preciso da sua assinatura.
Tião assina. A moça vai embora. Tião senta na mala e fica ali,
abandonado.
CENA 23 - SAGUÃO / NOITE
Passagem de tempo. Uma semana depois. Tião está na porta da sala
de desembarque do aeroporto. Liga pra Alice do celular.
               TIÃO
               Alice, tô aqui no Aeroporto, te esperando.
INTERCALADO COM
CENA 24 - QUARTO DE ALICE
Alice, em seu quarto, no Rio.
               ALICE
               E eu tô aqui, linda, cheirosa, esperando um amigo
               pra sair.
               TIÃO
               Que amigo?
               ALICE
               A Beth.
               TIÃO
               Mas, a Beth é amiga.
               ALICE
               Meu ombro amigo. Por sinal, ele chegou. Vou
               desligar.
               TIÃO
               Eu vou esperar por você, Alice, toda sexta-feira.
               Aqui, no aeroporto.
               ALICE
               Eu sempre soube que você tem tara por aeroporto.
               Tchau, Tião.
Ele fica lá, parado, magoado, sozinho ali.
CENA 25 - SAGUÃO / NOITE
Passagem de tempo. Uma semana depois. Tião está na porta da sala
de desembarque do aeroporto. Nada.
CENA 26 - SAGUÃO / NOITE
Passagem de tempo. Uma semana depois. Tião está na porta da sala
de desembarque do aeroporto. Nada.
CENA 27 - SAGUÃO / NOITE
A senhora da limpeza está falando ao telefone. Ao fundo, Tião
espera.
               SENHORA
               Sério, Alice, ele tá lá esperandoþ vem toda sextaþ
               traz até a tua mala.... horrível... não, não tô
               falando da mala... tô falando da situação do
               Tião... ele só vai embora quando desce a última
               pessoa do vôo... o quê? Bonitinho? Olha, Alice,
               emagreceu, mas tá bonitinho.
CENA 28 - SAGUÃO / NOITE
Passagem de tempo. Uma semana depois. Tião está na porta da sala
de desembarque do aeroporto. O celular dele toca. Ele atende.
INTERCALADA COM
CENA 29 - QUARTO / NOITE
Alice, na janela do quarto, luzes ao fundo.
               ALICE (MUITO NERVOSA)
               Tião, você está bem, Tião?
               TIÃO
               Alice, o que foi?
               ALICE
               Eu tive um pesadelo, (ela chora) um pesadelo
               horrível.
               TIÃO
               Que pesadelo?
Alice olha para a rua, a imagem de Tião, de quepe, surge
refletida no vidro.
               ALICE
               Eu sonhei que você era piloto de avião... (ela
               chora) você usava um quepe ridículo... (ela chora
               mais)
               TIÃO
               Você ligou porque eu estava usando quepe?
Um acidente aéreo, refletido no vidro, funde-se à imagem do rosto
dela.
               ALICE
               Não, Tião... o avião caiu... (ela chora) você era
               péssimo piloto...
               TIÃO
               Alice, foi só um sonho.
Um caixão e uma coroa de flores se sobrepõe por fusão ao rosto
dela.
               ALICE
               Você morreu, Tião, e apesar do quepe... (ela
               chora) apesar de ser péssimo piloto... (ela chora)
               TIÃO
               A ligação tá péssima!
               ALICE
               Eu fiquei arrasada... eu não posso viver sem você,
               Tião, você morreu...
               TIÃO
               Eu tô vivo, Alice, mais magro, mas tô vivo.
               ALICE
               Como é que eu vou saber que isso ainda não é o
               sonho?
               TIÃO
               Deita de novo. Deitou?
Alice deita.
               ALICE
               Deitei.
               TIÃO
               Eu vou cantar pra você dormir... (ele canta, sem
               jeito, no saguão do aeroporto, mas com muita
               doçura) "você faz tantos planos, fica voando em
               aeroplanos da imaginação, porque não faz seu campo
               de pouso, no aeroporto do meu coração".
A Senhora se aproxima, fecha os olhos, fica ouvindo Tião cantar.
Alice fecha os olhos, o rosto fica tranqüilo.
Tião desliga o telefone. A Senhora abre os olhos.
               TIÃO
               (para a Senhora) Dormiu.
A Senhora volta a varrer. Tião vai saindo do aeroporto. Toca o
telefone de novo.
               ALICE
               Você ainda tá guardando a minha mala?
               TIÃO
               Claro.
             
               ALICE
               Então tô chegando aí amanhã.
               TIÃO
               (emocionado) Eu vou estar aqui. Te esperando.
CENA 30 - SAGUÃO DO AEROPORTO
Outro dia. No saguão do aeroporto, ele espera. Ninguém chega. Já
saíram todas as pessoas do vôo. Suspense. Ninguém chega. Ele se
desilude.
Surge a senhora da limpeza (está com o vestido vermelho no
corpo). Tião olha pra ela.
               TIÃO
               Ela não vem.
               SENHORA
               Vem sim, Sebastião. Ela decidiu duas coisas: nunca
               mais perder você, nunca mais pegar um avião.
Tião olha para a Senhora, pensa um pouco, sorri. Ele dá um beijo
na Senhora e sai correndo.
CENA 31 - RODOVIÁRIA
Alice e Tião estão se abraçando na rodoviária. Maior clima de
love story. É um dia de neve em Porto Alegre.
Toca a música "Nuvem Passageira" de Hermes Aquino. Na versão
original.
FIM
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Embora possa parecer clichê de chat do Terra, tenho 1.80m, moreno e sensual, haha. Gosto muito de ler, jogar games, mexer com programação e sonho em ser um escritor reconhecido nesse país que ama um Big Brother...

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